segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Bixos Escrotos

    Eu fui almoçar.

    Já pelo caminho, passei em frente a uma república que praticava um trote nos seus bixos. Não consegui identificar de qual curso eram. Algazarra, som alto, gente pintada, uma piscina, humilhação, o de sempre, com fritas. Ignorei e segui em frente.
    Chegando ao bandejão, uma fila enorme. Ah, era só para os bixos. Menos mal. Pelo vidro na fila para carregar o RA eu já via muita gente pintada lá dentro, todas juntas num mesmo canto. Passei a catraca, lavei as mãos, vi umas meninas bonitas, as quais eu nunca mais verei na vida mas é assim que ela funciona. Peguei a fila, a comida, sentei.
    Alguns minutos depois, os bixos de fora, reconhecidamente como sendo do curso de medicina, entraram no restaurante universitário. O pessoal que já estava dentro, junto num canto, ergueu um coro, subiram e bateram nas mesas. Eu não entendi nada, a não ser pelo final que foi repetido várias vezes: "Chupa medicina!".
    Terminei de almoçar. Na saída, já tinha gente divulgando festa: "Luau dos Bixos". Daquele jeito animalesco de sempre, empunhando banners, distribuindo flyers e fazendo uma zorra quando flagravam um bixo e o persuadiam para ir na sua droga de festa.
    Peguei café e continuei o meu caminho. Passei pelo meu instituto. Algumas pessoas se confraternizavam, de leve e de maneira decente. Pelo menos não a ponto de rolar balbúrdia visível. Não, o IEL não é santo, mas as pessoas deixam para cometer suas atrocidades fora do campus ou ainda quando não tem gente passando para lá e para cá. Umas caras novas e assustadas com as novidades do lugar, esse ar de inocência de bixo é bonito. O bixo humilhado na algazarra, não. Até porque, isso gera um ciclo sem fim que, quando este for veterano, fará a mesma coisa e a babaquice, ela não terá fim, nunca.
    Voltaria para casa. Peguei o circular interno. No ponto do RU, os mesmos bixos de medicina que eu vira no começo desse texto estavam todos lá. E sim, todos iriam entrar no ônibus. E assim o fizeram. Logo, começaram a entoar seu próprio canto. Os organizadores-veteranos estavam todos bem vestidos, uniformizados com uma camiseta verde com escrita dourada: "Medicina Unicamp 2013". Às costas, a mascote do curso, um leão, também dourado. Eu não lembro qual era o grito deles, só lembro apenas que "LSD" rimava fortemente com "bota pra foder".
    Essa rivalidade entre faculdades, entre cursos, "ah, o meu é melhor que o seu" ou "vai se foder você que é do curso X porque eu sou do curso Y". Só eu enxergo tamanha estupidez e falta de bom senso nessas coisas? Sabe, eu me julgo muito mal: eu não me graduei semestre passado, eu tranquei um semestre, eu reprovei disciplinas, etc. Mas quando eu vejo pessoas assim, eu não consigo não deixar de ser orgulhoso e pensar: "cara, eu não sou tão ruim assim". Essa mesma galera, essa mesma high society organiza e pratica badernas mil graduação afora. Daí qualquer um vem me dizer: "oras, mas isso faz parte da vivência universitária". Eu devolvo dizendo que é mentira, eu não passei por isso, por não me identificar com esse tipo de selvageria moldada de diversão. Então, logicamente, essa mesma pessoa teria o direito e a razão de retrucar que o problema é comigo. Justo.
    Na volta, passei de novo pela república e dessa vez a baderna acontecia na rua. Fazer o quê? Sempre foi assim, sempre será. Não sou eu quem vai mudar isso, e acredito que ninguém vai.
    Mas que eu discordo dela, sem dúvida.



-G-
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terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Som

Eu ouço o que não existe
Uma voz escondida no meio dos ruídos
Que sei não estar lá.

Agora mesmo
Usava o microondas
Ou aqui com o ventilador
Ou logo mais no banho e a tv ligada.

Ruídos dentro de ruídos dentro da minha cabeça
Sei que não existem
Mas algo me divide
Entre a realidade e a loucura
E eu me pergunto:
E se existir?

Um lado diz que é impossível
O outro diz que é apenas improvável
Eu fico nesse impasse, desejando apenas que passe.

Uma ventania que encoberta
Os latidos dos cachorros da vizinhança
Não me deixa saber diferenciar dos possíveis gritos da noite.

Outra situação se dá quando,
Indiscretamente,
Pego-me ouvindo um soluçar ao longe.
Estaria a pessoa chorando ou rindo?
Em cada um dos extremos das sensações
Se você reparar bem
Perceberá que são similares.

Não é curioso?
Duas sensações tão distantes
Que aos ouvidos descuidados
Soam tão semelhantes.

Gosto do silêncio
Aterrorizo-me
Na
Quebra
Abrupta
Dele.

Não tem motivo este barulho
Pare com isso
Estupram-me os ouvidos
Não quero, não posso.

Antes do anoitecer
Já me encontro só
Uma outra noite que se vai
Dentro da escuridão
As ondas ilusórias riem de mim.
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Este é um texto que fiz pra um concurso virtual no fim do ano passado. O concurso passou, não venci (não esperava mesmo que fosse), mas ele precisava ser inédito. Então, só agora pude postá-lo. E como faz tempo que não posto nada, taí uma oportunidade. 


-G-
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terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

suicídio coletivo

não tinha coragem de me matar. contratei alguém para que o fizesse. por sorte, o cara era um profissional, recebeu o pagamento e acatou minhas ordens de matar a mim e a todos os passageiros do ônibus em que estava. não, eu não conseguiria me matar e nem matar os outros. por sorte, de novo, sendo a viagem de madrugada, nenhum outro ou muito pouco deles percebeu a explosão que ocorreu no meio da madrugada. uma bomba fora implantada na minha mala, que estava no bagageiro. eu estava acordado. não sabia que horas seria a explosão, deixei a cargo do assassino, bem como em que parte do percurso da viagem ela aconteceria. espero que fosse num momento sem outros carros na estrada. chega de mortes desnecessárias por minha culpa. culpa. já não tenho mesmo facilidade para dormir, muito menos sabendo que estou prestes a morrer. ainda por cima levando muitas outras pessoas comigo. sou vítima e matador. tal qual um homem bomba. porém, diferente de matar por religião, eu me matei por covardia. suicídio já é covardia. ainda mais quando se pede para um terceiro matar a você e todos ao seu redor, isso é no mínimo imperdoável. essas são as minhas últimas letras. quando virem isso, já estarei morto. sou um covarde egoísta. ou ao menos era. uma peste, uma praga que não tinha espaço no mundo. a melhor coisa que fiz foi me dar um fim. quanto aos outros? destino. ou falta de sorte. ou estarem no lugar errado na hora errada. agora já foi, foram, fomos. poderia encerrar pedindo desculpas, mas elas seriam de extrema hipocrisia, sendo que o desastre era evitável. mas a minha mente doentia, não.



-G-
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