Envelhecer é um dos atos mais cruéis.
Primeiro porque não tem escapatória. Segundo que não é cometido por ninguém –
apenas acontece. Só resta mesmo o espanto quando a passagem do tempo grita pra
gente nos momentos mais inesperados.
Eu sou um tanto acumulador, guardo
coisas que muitas vezes não tem necessidade, servindo apenas como um resquício
nostálgico. É a mesma função, se for ver, de uma fotografia. Só que
transubstanciado em outros objetos. Olha quantas memórias já perdemos. É normal.
Algumas se foram tarde, outras podiam ficar mais um pouco. Nada realmente importante
porque todas terão o mesmo destino quando das nossas mortes, meros mortais que
somos.
Também existem períodos da vida que
são mais memoráveis. Não se lembra da infância do mesmo jeito da
juventude/adolescência. Aí quando cresce e vira jovem-adulto as memórias perdem
espaço a compromissos, paranoia e boletos a serem pagos – não nessa ordem. Com isso,
imagino que esse período de adolescência – que é inclusive uma terminação recente,
o conceito não existia há 50 anos, talvez pela mesma razão que fora necessário
diferenciar o que é ser normal daquilo que não se é – seja de grande produção de
memória. Muito acontece com os nossos corpos, em nível físico, químico,
psicológico e social. Até por este período de interregno, quando passamos dessa
fase e viramos pagadores de boletos, não temos mais muita paciência com adolescentes
alheios, esquecendo-se, com isso, do quanto provavelmente já irritamos outras
pessoas estando na mesma situação.
Quando jovens, queremos seguir modas
para então sentirmos parte de integrantes de grupos – eu hoje não me vejo parte
de muitos grupos populares e sinto como faz falta, mas agora já é tarde. O que
faz com que esses jovens acabem tomando decisões que parecem incoerentes aos
olhos de pessoas mais velhas, em especial dos pais, mas que, para a molecada,
faz total sentido. Eu tinha esse amigo que morava em SP capital e descia à
Praia Grande, onde morei na adolescência, em férias e feriados. E os nossos
estilos eram diferentes. Ele usava roupas de marca e eu achava aquilo o máximo.
Enfim, adolescente é um bicho difícil. Meus pais diziam que não fazia sentido
pagar caro só por uma determinada marca quando outras roupas mais baratas
faziam o mesmo serviço. Agradeço a eles por isso. Mas venho dizer, hoje, que
eles estão certos e errados. E ambos os argumentos já foram expostos no texto: certos
pela finalidade, errados pela questão social de se fazer parte de um grupo.
À época, desejava-se marcas de surf
e do skate, como Quiksilver e Okdok. Peguemos essa última. Assim, num natal,
esse meu amigo me presenteou com uma camiseta da marca. E então eu tinha um objeto
que me integraria a um grupo – ou não. De fato, não me alterou em nada. Gostei do
presente e o ostentava orgulhoso quando possível. Mas era só isso. Algo que só
faz sentido em adolescentes, mesmo.
Eis que, hoje, 10 anos depois,
trombei com a camiseta no lixo. Virara pano de chão e chegou num ponto que não
prestava mais – tudo isso pela lógica da minha mãe que provavelmente não sabia
da ligação que eu tinha com o item. Ela sempre pragmática, e eu, como disse, um
tanto acumulador. Nem é só essa a questão. É envelhecer. Como algo que antes tinha
significado, depois de um tempo, nem serve como pano de chão. A memória da
época fora transformada e está prestes a ser descartada. Para que eu não me esqueça,
pois, que fique então eternizada em formato de texto para quando minha memória
não der mais conta.
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